Na nossa cidade não deviam existir tardes tão sozinhas
Nem esquinas cheias de acidentes fatais
Na nossa cidade não devia existir a hora triste
Depois de uma derrota nossa para o mundo
Na nossa cidade não deviam existir amores negados
Nem ruas desertas com casas mudas
Nem aquele tempo que se leva para dormir
Que enche o quarto de dúvidas
E nos dá aquela pequena vontade de morrer
No nosso bairro não devia existir a rua de cima
Que sempre ganha os campeonatos de jogo
Nem o céu com tantas nuvens cortando
A nossa conversa com o sol
No nosso bairro não devia existir a gargalhada alta
Das prostitutas que riem de mim
Nem tanta cor na paisagem
Que a gente vê mas não tem
Na nossa rua não devia existir o vizinho tão melhor
Nem os dias de mais frio do que roupas
Nem mais fome que comida
Na nossa rua não deviam existir os amigos que não moram mais
Nem este festival de mães mortas
Que abaixaram para sempre a cabeça dos filhos
Na nossa rua não devia existir caminhar na calçada
Com esperança de algo que não se sabe o quê
Na nossa rua não devia existir a saudade
Da infância que foi há anos ou ontem
Nem muros tão altos com cachorros lá dentro
Que se a bola cai não tem como pegar
Na nossa rua não devia existir a doença de lembrar
Nem o telefone público
Que transforma o abraço em palavra...
Na nossa rua não deviam existir tantas palavras
Fazendo procissão por tudo que há
Nem a gente brincando de tristeza
Tarde da noite quando já é a hora do soninho
E não de existir.
(Adrian L.)
Um comentário:
na nossa cidade, nosso bairro, nossa rua... não deveriam existir tantas coisas mesmo. mas são estes ciscos fora do lugar que nos motivam no final das contas. como a lenda da bailarina e da sua perfeição inexistente. por mais que junto com isso, venha um pacote ENORME de medos, ser humano (de preferência quando NÃO se age como tal. concordando com o bom e velho Hobbes, o ser humano é essencialmente ruim.) é grandioso.
Dé.
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